Seguiu-se a Segunda Sinfonia dos Campos de
Pinheiros com toda a sua elegância magistral, seus tons alegres e felizes. O
outono se desfazia rapidamente, da mesma forma como tinha chegado para
desvanecer o terrível inverno de sentimentos.
Ao outono, seguia-se o verão.
A ordem das estações pode estar um pouco
confusa, mas, naquele teatro, as coisas aconteciam conforme a música que se
tocava, e aquela música era como um verão ainda tímido, iniciando-se, com o Sol
começando a desbravar as nuvens e mostrar seu calor. As estações ali tomavam
forma conforme os corações dos regentes da sinfonia.
E agora os regentes estavam assim: ainda
tímidos, mas exalando o calor de seu amor através das notas. A neve derretia
cada vez mais, até que nada dela restou.
Cada vez mais pessoas ficavam sabendo da
novidade, ouviam a música se espalhando por quilômetros e iam até o teatro para
apreciar aquela bela sinfonia.
A maestrina se aproximava cada vez mais,
voltando para o seu amado, aceitando-o de volta. O maestro continuava a cantar
e dançar e tocar e reger os instrumentos do palco e os do público.
Para o observador mais atento e sensível,
percebia-se um pequeno toque de tristeza naquela música, e era este toque que
impedia que o Sol brilhasse realmente forte. A tristeza era a saudade, que apertava
os corações quase recompostos dos regentes. Uma saudade tão grande como nunca
tinham sentido antes, uma saudade que chegava a doer fisicamente, a fazer o
corpo ansiar pelo toque do outro, pelo abraço e pelo beijo, ou apenas pelo
sorriso. Ainda assim, apenas o tempo agora os separava.
Ou talvez não.
Um contratempo, notas dissonantes, uma
percussão atravessada.
Em outro ponto, uma música pesada se chocou
contra a sinfonia suave do grande teatro.
As ondas se chocavam e se destruíam,
aniquilando-se. A música do maestro começou a se perder. Não conseguia se
afastar do teatro e às vezes nem mesmo chegar à maestrina.
Uma dor repentina assaltou-os: o medo.
O violino da esperança caiu ao chão, sem
conseguir manter seu ritmo, suas cordas desafinando e estourando, as crinas de
seu arco arranhando as cordas que restaram de uma maneira quase fúnebre, até
que ele desistiu de produzir qualquer som.
A maestrina parou. Uma pesada barreira
impedia-a de se aproximar de seu amado maestro, impedia que o maestro chamasse
sua amada maestrina.
Os espectadores ficaram tensos, alguns
pararam de tocar, outros mudaram o tom de sua música. Eles enviavam ajuda com
suas notas, mas algumas nem mesmo chegavam ao maestro, quanto mais à maestrina,
que se afastava cada vez mais contra a sua vontade.
Os regentes não conseguiam mais se
comunicar e a tristeza foi tomando forma novamente, iniciando na maestrina e
forçando sua passagem pelo coração do maestro.
Ele caiu e chorou. Chorou rios de lágrimas
e sangue e deixou que seu violino caísse. Novamente o teatro estava em
silêncio, quebrado apenas pelos soluços afogados do maestro que jazia de
joelhos no palco, tentando abafar a dor em seu coração. As pessoas começaram a
sair novamente, mas não todas. Os amigos ficaram, mas eles não sabiam exatamente
o que fazer, por isso apenas observaram novas manchas no palco, dessa vez,
causadas pelas lágrimas do maestro.
Ele era mais forte do que isso. Não ia
desistir, não desistiria nunca mais.
Seu coração bateu forte, ainda que sem um
compasso definido.
Ele seria a força de ambos, ele não
deixaria que a esperança deixasse de tocar.
Retirou as cordas do seu violino e foi até
onde o violino da esperança tinha caído. Trocou as cordas uma a uma, pegou seu
arco e levantou-se, majestoso em sua dor. Uma tristeza feroz emanava dele, que
a usou para se pôr a tocar.
Agora era ele quem regia a esperança, ele
quem a tocava. A esperança não depende de ninguém além de quem a sente, e ele
estava decidido a não deixar que ela acabasse.
Um trovão retumbou pelo céu logo após o
clarão que iluminou todo o teatro e centenas de quilômetros ao redor. De lá de
dentro, o maestro pôde enxergar a maestrina, sofrendo novamente. Não ia
permitir que isso acontecesse.
Raios rasgaram os céus quando as primeiras
gotas torrenciais banharam o chão, o palco, os sentimentos.
As chuvas do verão haviam chegado.
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