6 de abril de 2011

Do terceiro, um pedaço

Eu corria como nunca tinha corrido antes. A paisagem voava ao meu redor devido à velocidade. Depois de tantos anos de lutas pela sobrevivência, tanto minha quanto daqueles que amo, treinamentos exaustivos e guerras intermináveis, eu estava orgulhoso com o que tinha me tornado. Eram poucos os que podiam me enfrentar e viver por mais do que alguns minutos.
Quando eu decidia que alguém ia morrer, esse alguém morria.

Ainda assim, eu não era um assassino. Não gostava de matar. Matava porque era necessário, porque os mundos estavam em guerra e para que a guerra acabasse pessoas precisavam morrer. Tecnicamente não precisavam. Se eles se rendessem, eu não seria obrigado a matá-los. Mas poucos eram os que se rendiam. Até mesmo quando eu aparecia na frente deles, imponente, visivelmente poderoso na minha armadura refulgente, com meu enorme escudo energético e minha espada de cristal e oferecia à eles a rendição, muitos se recusavam e se jogavam contra mim, só para morrerem no segundo seguinte.
Fazia muito tempo que um homem comum não podia me oferecer resistência.

Já os magos eram outra coisa. Alguns homens, por exemplo, se rendiam quando eu tinha tempo para explicar o que estava acontecendo, até porque muitos deles não sabiam pelo que lutavam. Mas já os magos eram orgulhosos de seus poderes e nenhum nunca tinha se rendido. Por conseqüência, todos os que eu tinha encontrado até hoje tinham morrido, na maioria das vezes pelas minhas mãos.

Agora eu corria desesperadamente tentando impedir que o maior deles devastasse mais um mundo. Ele tinha me enganado, criado uma armadilha na qual eu tinha caído perfeitamente, mas eu não podia deixa-lo escapar. Não dessa vez, porque dessa vez era no meu mundo
Eu corria através de uma estrada abandonada há anos. A guerra tinha chegado logo em seguida de eu ter saído dali. Agora o mundo estava devastado. E agora eu sabia que corria diretamente para a verdadeira armadilha.
Ele havia atraído os nossos exércitos para um outro mundo e praticamente ao mesmo tempo, iniciara um ataque contra o meu, pois sabia que não tínhamos como deslocar o exército tão rapidamente, ainda mais em meio a uma batalha. Ele sabia que eu correria para socorrer o meu mundo. Ele sabia que eu ia sozinho. E eu também sabia de tudo isso. Ainda assim, eu ia.
Cheguei ao alto de um morro e parei. A cidade estava lá embaixo, vazia, sombria, silenciosa.
Vasculhei-a com meus olhos aguçados, procurando sobreviventes, inimigos, qualquer coisa, mas não via nada, nem sentia ou ouvia alguma coisa.

Senti um ódio descomunal dentro de mim. Ele ia me pagar por isso!
Agachei, acumulando energia nas minhas pernas, e saltei, usando o vento para ajudar a me deslocar.
Subi muito alto e percorri a distancia que faltava até a cidade rapidamente, passando por cima dos primeiros prédios enquanto ainda subia. Enquanto “sobrevoava” a cidade, ainda não via nada, nem mesmo uma pessoa, nem mesmo a presença de uma pessoa ou qualquer outra coisa viva eu sentia.
Desloquei as correntes de ar para me fazer descer. Entrei em um mergulho acentuado, indo de cabeça te o chão. Quando estava há apenas uns dez metros, girei no ar, ficando com as pernas para baixo, e cai com força no chão. O asfalto rachou embaixo de mim e o som reverberou por entre os altos prédios da cidade fantasma.

Ergui-me lentamente, a armadura semitransparente refulgindo com os últimos raios de um Sol que se punha. Eu estava sem capacete e podia sentir a leve brisa fria da noite que chegava.

Olhei para o horizonte, diretamente para o Sol. Uma sombra passou na frente dele.

Sim, eu tinha chegado à armadilha.
O Sol desapareceu, mergulhando tudo ao redor na escuridão. Olhei para cima e vi as estrelas brilhando no céu sem Lua. Agora eu podia ouvir as sombras se mexendo fugazmente no ar, ocultando momentaneamente algumas estrelas.
Refiz meu capacete, congelando a água ao redor da minha cabeça até o zero absoluto, me alimentando da energia que ela retirava do ambiente.
Ainda não podia ver nenhum deles com precisão, mas sabia que eles estavam ali, me rodeando, cada vez mais próximos, às centenas.

Ergui meu punho esquerdo acima da cabeça e mandei uma mínima quantidade de energia de ativação para o cristal que se encontrava ali. Ele brilhou fortemente em meio às trevas e o escudo se abriu. Abaixei o braço, sentindo a enorme quantidade de energia que pulsava ao meu lado praticamente sem peso algum. O escudo redondo emitia um brilho azulado que era sua própria constituição: luz e energia.

Antes de tudo começar eu precisava ver pelo menos quantos adversários enfrentaria.
Ergui novamente o escudo acima da cabeça, dessa vez segurando com as duas mãos. Concentrei a energia acumulada nele, preparando-a para liberá-la. Dobrei levemente os joelhos, uma perna à frente da outra, olhando para cima, ao redor. Quando estava no máximo da tensão, liberei a energia em uma explosão.
A luz azul viajou para todos os lados em uma cúpula de poder, iluminando centenas de metros ao meu redor. E em cada um desses metros havia uma sombra humanóide flutuando no ar na minha direção, deixando farrapos imateriais por onde passavam. Eram centenas e centenas, incontáveis, todas indo na minha direção, prontas para matar. Estavam por todos os lados.
Abaixei o escudo e puxei a espada, me colocando em posição de combate. Olhei ao redor, desafiando-as enquanto a luz se extinguia.

Era uma batalha que elas queriam? Uma batalha elas teriam.
E era eu que ia vencer.

Todas avançaram para mim no mesmo instante.

Saltei no ar com um grito que ecoou por quilômetros, explodindo em luz, pronto para uma batalha da qual as estrelas jamais se esqueceriam.

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